segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Quando teu som invade meu meio

Em um primeiro instante, teu som invade meu meio, depois ele passa a fazer parte do meu meio junto ao meu som. Teu meio se torna base para meu meio. Nossos meios transitam entre si. Nossos sons se transformam, nossos meios se deslocam, meu som coabita teu meio, assim como teu som coabita meu meio.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Opus X teclado para objetos sonoros

Opus X, para teclado de objetos sonoros

(texto escrito por Marina Mapurunga, publicado no Catálogo da Exposição Conexões Estéticas de 2011.
Opus X, estará exposta novamente no dia 7 de fevereiro de 2012, na Vila das Artes- Rua 24 de maio, 1221 -Fortaelza-CE, de 14h às 20h)

“É imensa a capacidade criativa do ser humano em manipular o som – mesmo porque ele vai acompanhá-lo de perto durante toda a sua vida, mais que qualquer outra criação do espírito humano.” Julio Medaglia


Pierre Schaeffer
Novas possibilidades de se pensar música são pensadas a partir das tendências musicais do século XX, como a politonalidade, a atonalidade, o expressionismo, o dodecafonismo, a música concreta, a música eletrônica, a música aleatória, entre outras. A música passa a não ser somente uma estrutura formal, com regras de melodia, harmonia, ritmo e tonalidade, aos poucos ela se torna um som aleatório, dissonante, atonal. Com o Impressionismo, termo adotado da pintura, compositores, como Debussy, se utilizavam mais do seu instinto musical do que das regras de composição. No fim da década de 40, surgiu a música concreta com Pierre Schaeffer. “Os sons por ele registrados eram sons naturais, como o de uma porta batendo, uma rolha saltando da garrafa, etc.” (BENNETT, 1986, p. 76). Com a música aleatória, como a própria etimologia da palavra aponta (do latim, alea: dado), a imprevisibilidade se torna um guia para a composição. Pode-se dizer que seu pensamento é similar ao do dadaísmo na literatura, em que palavras são colocadas aleatoriamente numa folha de papel, dando surgimento a um texto, muitas vezes, sem coerência. John Cage e Stockhausen compuseram músicas em que o músico fica livre para a escolha da ordem das páginas da partitura que irá tocar.  Em Zyklus, de Stockhausen, o instrumentista pode até tocar com a partitura de cabeça pra baixo. Em outras obras, não há nem a indicação de notas musicais. Cage em suas Sonatas e Interlúdios, “[...] criou novos sons 'preparando' o piano: nozes, correntes, parafusos, pedaços de borracha e de plástico eram inseridos sobre e sob certas cordas desse instrumento. Isso afetava tanto no timbre como a afinação das notas, produzindo sonoridades profusamente variadas, a sugerir sinos, gongos e tambores orientais.” (BENNETT, 1986, p. 75).
John Cage

O conceito de música é revisto a partir deste momento de ruptura ocorrido no século XX, em que a definição de música meramente como sons pode ser pensável. John Cage respondendo a pergunta de Murray Schafer quanto a sua definição de música diz que “Música é sons, sons à nossa volta, quer estejamos dentro ou fora de salas de concerto.” (SCHAFER, 1991, p. 120). Em 4'33'' Silence, de John Cage, é o ambiente exterior à orquestra que cria a música. Enquanto a orquestra se posiciona, mantendo-se parada durante os quatro minutos e trinta e três segundos (título da obra), os sons da platéia, da sala de concerto, os sons exteriores que invadem esta sala é que cria a composição de Cage. Nunca essa obra é a mesma, a cada ambiente, público e situação ela se modifica.

Estamos rodeados por sons, sempre. Impossível não ouvirmos nada. Mesmo que tapemos nossos ouvidos, ouviremos o som de nosso corpo. O que se passa é que as pessoas já não percebem tão bem os sons, por estarmos em meio a uma massa de ruídos, de poluição sonora. Os objetos têm sons peculiares que nos atraem e nos repelem. O som nos traz à memória. O som das chaves abrindo a porta – alguém chegando-, do talher caindo na cozinha – alguém descuidado -, dos pratos sendo colocados à mesa – hora de comer-, da porta da geladeira abrindo -fome-, do liquidificador -alguma vitamina sendo preparada-, do brinquedo que tínhamos quando criança -lembrança da infância-, das moedas dentro do porquinho de barro -será que já tenho dinheiro o suficiente?-, do relógio fazendo tic-tac -está muito silencioso para eu poder ouvir este relógio-, do estabilizador ligado na tomada -isso não me deixa dormir-... Sons e mais sons, marcas sonoras de nossa vida.

Edgar Varèse
Um dia estava dentro de um ônibus parado no sinal vermelho e ouvi um som com um ritmo bem interessante. Procurei a pessoa que estava batendo este ritmo. Olhei para todos os lados e não encontrei. Fechei os olhos. Pensei: “Com o que se parece esse som? Será um carro? Não, o timbre não é parecido. Tem o timbre de um motor de uma moto, não, não é porque o ritmo está variando muito. Deve ser mesmo alguém batendo neste ônibus, está muito 'humano' para ser uma máquina.”. Passei a repetir este mesmo som batendo meus pés, estava adorando, quase dançando e ainda curiosa para saber de onde vinha esse som. Quando o sinal abriu. O som que estava variando, de repente se torna linear e sai em alta velocidade ao lado do ônibus. Não! Sim, era realmente a moto. Porém, com algum problema no motor. Para mim, aquele som era música, era um som que tinha a intenção de ser música. Claro que o som não tinha essa intenção, muito menos (pelo que penso) o motoqueiro. Mas em minha mente, aquele som estava com aquela intenção – ser música. Temos tantos sons interessantes, por que não os exploramos? Não necessariamente precisamos ter um instrumento musical para que haja música. Podemos fazer músicas com os mais diversos sons. Como John Cage disse: “Música é sons, sons à nossa volta”. Pensei em Pierre Schaeffer, em Edgar Varèse, em Iannis Xenakis, em várias esculturas sonoras... Criar uma trilha sonora com objetos sonoros, esse era o objetivo. Unir um instrumento musical – o teclado – a objetos do nosso cotidiano, objetos que muitas vezes não percebemos seus sons ou objetos com sons marcantes que ativam nossa memória. Compor uma obra (opus) incógnita (X), seja ela improvisada, pensada ou escrita no caderno de pautas para que outros possam lê-la e tocá-la. Uma obra cheia de movimentos: allegro, largo, andante, presto, entre outros. O meu movimento, o seu, o dele, o daquele, o de todos nós – um único movimento.




Referências bibliográficas:
BENNETT, Roy. Uma breve história da música. Trad.: Maria Teresa Resende Costa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1986.
MEDAGLIA, Julio. Música, Maestro!: do canto gregoriano ao sintetizador. São Paulo: Globo, 2008.
SCHAFER, Murray. O Ouvido Pensante. Trad. Marisa Fonterrada, Magda Gomes da Silva, Maria Lúcia Pascoal. -São Paulo: UNESP, 1991.













OPUS X para teclado de objetos sonoros - Instalação Sonora, na Vila das Artes

sábado, 11 de junho de 2011

Experimento I - o vídeo


SENSVS, Experimento I ::: Curta metragem sobre sons, corpos e sensações.

O Projeto SENSVS é um experimento de como o som influencia e interfere nos atos, nas emoções e nas sensações de alguém. O sentido da audição permitirá que os sons funcionem como motor do corpo. O que estes corpos irão sentir? Irão se mover? Irão se emocionar? Ou simplesmente interromperão a experiência? Como se dá a relação entre sujeito/sons/câmeras?
Direção: Marina Mapurunga. Produção: Amanda Pontes e Sarah Holanda. Fotografia: Andressa Back, Daniel Bezerra e Dryca Lima. Arte e Iluminação: Raisa Christina. Som Direto: Artur Mota e Washington Hemmes. Edição: Andressa Back, Dryca Lima e Marina Mapurunga. 

Convidados ao experimento:
Alexandre Veras, Alfredo Barros, Ana Carolina Bezerra, Jade Bezerra, Marina Ferreira Coutinho, Nonato Ferreira, Sandro de Araújo e Tiago Fortes.

Fortaleza - Ceará - Brasil. 

Realização: Escola de Audiovisual de Fortaleza. 

Apoio: SESC Fecomércio e Animula Produções Audiovisuais

Experimento I - produção


Produção do Experimento I

Convidamos doze pessoas da cidade de Fortaleza-CE (Brasil), com perfis diferentes (ex: motorista de ônibus, dona de casa, professora de ensino fundamental, ator, músico, entre outros), para participar de um experimento que seria uma mostra de imagens e sons, seguida de uma entrevista e que ambas seriam gravadas. Marcamos a hora e a data para cada participante comparecer separadamente ao local, o qual era um teatro. 
Ao entrar no teatro, o participante se deparava com uma cadeira em cima do palco, a qual ele sentaria e colocaria uma venda nos olhos e um headphone, que estava acoplado a um receptor, em seus ouvidos. 
Explicamos as regras do experimento: 
1- ele(a) ficaria livre para fazer o que quisesse no palco; 
2- poderia tirar a venda, mas o seu experimento seria interrompido; 
3- durante o experimento nós (equipe) não nos comunicaríamos com ele(a), ou seja, só falaríamos com ele(a) ao término do experimento e
4- ele(a) poderia falar conosco.

Ao sentar-se, o participante percebe que a câmera está a sua frente, em uma das últimas fileiras de cadeiras onde ficaria o público. É importante lembrar que no teatro só havia a equipe do projeto SENSVS Experimento I e o participante. 

Nossa proposta era fazer daquele experimento um vídeo performance, uma performance realizada tanto pelos partipantes vendados conduzidos ou não pelos sons que ouviriam como uma performance da própria equipe que também entrava em cena. 
Na equipe haviam 10 pessoas. Após colocarmos a venda no participante, entravam em palco Washington Hemmes e Artur Dória que fariam o som direto dos sons emitidos pelo participante. Também subia ao palco Dryca Lima, a qual gravava a imagem do participante com uma handcam. As suas imagens eram mais próximas ao participante, ela também tinha um headphone com receptor e ouvia o mesmo que o participante ouvia. Podemos dizer que sua câmera é uma câmera mais íntima ao participante. 
Andressa Back comandava outra câmera que percorria o teatro, filmava tanto a equipe quanto o palco. Chamávamos esta de câmera livre. A única câmera que o participante percebia era a principal, a qual citei acima. Esta se concentrava na situação geral do palco e foi operada por Daniel Bezerra. Este e Andressa não ouviam o que os participantes ouviam. No primeiro andar do teatro, ficava uma câmera no tripé, a qual era operada por nosso amigo Ythallo Rodrigues. Esta câmera fazia um plano bem mais geral e em plongée. Mais acima, na mesa de iluminação do palco, ficava Raisa Christina. A cada som, Raisa modificava a iluminação, que tinha sido marcada antes do experimento. Raisa também ouvia os mesmos sons do participante para ter um controle mais preciso no momento das passagens de som/luz. 
Eu, Marina Mapurunga, ficava controlando o som a partir de um MP3 player e de um transmissor. O MP3 player foi a nossa escolha devido a mobilidade. Poderia controlar o áudio em movimento. Isso não era recomendável, mas se fosse necessário teríamos como o fazer. Como estava no controle do som transmitido, possuía headphones, porém precisava às vezes tirá-lo para ouvir o som ambiente do local que também estava sendo gravado. Também ficava atenta aos enquadramentos das câmeras que ficavam fora do palco e no térreo. Amanda Pontes e Sarah Holanda revezavam a produção e davam o apoio de dentro e fora do teatro.





Os sons apresentados ao participante eram oito, nesta sequência, cada um com cinco minutos de duração:
1) o som que tenta imitar o ventre materno, com som de líquido e batidas cardíacas
2) o som da feira da Beira-Mar
3) o diálogo entre duas mulheres conversando em uma língua inexistente
4) o som de trânsito e construção de obras
5) o silêncio
6) o som de um violoncelo tocando Bach
7) o som do ruído de uma TV fora de sintonia
8) o som de música eletrônica

Durante o experimento, fomos surpreendidos por várias atuações dos participantes. Alguns ficavam estabilizados na cadeira, outros falavam, outros cantavam, uns dançavam... O som funcionando como motor do corpo. O conhecimento da presença de uma câmera e da equipe fazia com que alguns ficassem imóveis, outros exageravam na performance e outros, mais acostumados com câmeras, pareciam não dar muita importância a ela.
Uma série de elementos podem ser estudados, discutidos e analisados a partir desse material. 


Ao fim de cada experimento, fizemos entrevistas com os participantes. Alguns faziam relatos bem próximos aos outros, assim como bem divergentes. Todos os sons eram iguais para todos participantes, no mesmo tempo e na mesma sequência, não modificamos nada. Porém, cada um via/ouvia de uma forma diferente, visões/audições diferentes de um mesmo objeto (o som). 

Ao fim de todo o Experimento I, chega a hora da pós-produção... Essa será uma nova postagem...


por Marina Mapurunga.